À
minha mãe
Eu não sei o que é o amor.
Em certos dias – feriado de domingo,
0h47, frio e chuva fraca –, até desconfio ter um travo por dentro, me corroendo
em acordes menores, como se me fosse reservado um painel sem cor.
Já tentei. Por duas vezes, tentei amar.
Comecei me apaixonando. Escrevi cartas.
Namorei. Fiz juras de amor. Ofereci provas. Fui monogâmico à revelia. Construí
edifícios, cada qual de quatro anos. Na metade do prédio eu já sabia que não
tinha mais amor. [E minha carga de desejos é terrível, sufocante.]
Meus amores são semiáridos. Tenho sede,
mas represento um deserto, areia escassa e truculenta. Digo do amor como um
mecânico ao telefone. Mecânico.
Moro sozinho e na mesma casa há quase
dez anos.
Morar sozinho é um exercício de amor ao
próprio território, é não se desesperar no dia em que solidão pisa no peito,
nem se entregar às mulheres carinhosas que pedem quartos. É viver numa pulsação
de noite, silêncio e retorno.
Neste Dia das Mães, inúmeras manifestações
de afeto nas redes sociais. Os almoços protocolares. Os amigos que viajam aos
seus parentes. Não me encontro em nenhuma ideologia afetiva e, para piorar,
sempre fui um ator ruim.
A minha mãe mora aqui pertinho. Tenho
certeza de que ela não esperava ter um filho tão impróprio ao amor. Eu pouco
abraço, de vez em quando uso a ironia para demonstrar o quanto ainda preciso de
seu abrigo, sei que ela tem medo de perguntar de meus rumos amorosos, falo
pouco.
Sempre amei em disritmia. De tempos em
tempos, resplandeço em Piaf, mas logo estou no mesmo subterrâneo.
É insuficiente, sempre é.
Minha mãe, onde foi que errei?
Como poderei ser inteiro se me falta coração?
ouça a música "Padam, Padam..." de Edith Piaf em:
Por Daniel Zanella
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