Mostrando postagens com marcador alteridade. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador alteridade. Mostrar todas as postagens

11 de dezembro de 2013

E se o tempo passa de qualquer forma...




Hoje faz 3 meses que coloquei minha vida dentro de meia dúzia de sacos plásticos a vácuo e fiz tudo caber dentro de dois volumes de 32kg. Faz 3 meses que deixei a 8300km minha casa, meu amor, família, amigos, cães, conforto, roupa lavada, sopa pronta no fogão e ainda  transformei um curso que já era longo em algo 12 meses maior. Vendo a minha antiga vida passar, sabendo que ela não vai esperar por mim e não há mais caminho de volta.


Que bom.


Que bom que tive a coragem que precisava, na hora que precisei. Que faço isso com o apoio da minha família, amor e amigos. E tenho essa chance que nem todos têm. Nunca mais serei a mesma e fico feliz com isso.


Aprendi que as “pessoas”, principalmente os “momentos com as pessoas”, são mais importantes que as “coisas”. Aprendi que usar por favor, obrigado e com licença não nos deixam mais pobres, muito pelo contrário. Que uma instituição de ensino que se preze precisa, acima de tudo, respeitar seus alunos. E que, de forma mútua, os alunos devem ter o mais imenso respeito pelos professores. Que diversas culturas podem e devem viver em harmonia num mesmo ambiente, sem rótulos, sem segregações e sem a necessidade de abrir mão da sua pátria de origem. Vejo também, com tristeza, que meu país está mais de 50 anos atrasado na cultura do esporte, e isso me entristece de verdade. O país do futebol, e das olimpíadas, não tem hoje o que eles já tem aqui (Canadá) há décadas. Mais uma prova que nossos atletas, técnicos e profissionais do esporte são verdadeiros guerreiros por ainda assim chegarem tão longe.


Vejo meus próximos 9 meses de forma muito promissora e especial. Quero aprender alguma coisa, mesmo que pequena, todo dia. A saudade é grande, mas o tempo está passando muito rápido. E se o tempo passa de qualquer forma, por que não fazer alguma coisa diferente com ele?  


“Uma mente que se abre a uma nova ideia jamais retorna ao seu tamanho original.” (A. Einstein)

Isabel Ziesemer Costa

15 de maio de 2013

Limbo





No consulado americano do Rio, o rapaz que nos entrevistou não quis acreditar: O que vão fazer no Alabama?

Mais de duas décadas depois ainda estamos aqui em Birmingham, Alabama, sul dos Estados Unidos. A princípio tudo nos encantou. A quantidade de árvores, a vida calma tão diferente do Rio, o espaço das casas e apartamentos. Resolvemos ficar, aumentar a família, comprar uma casa.

Aos poucos fomos vendo que criar filhos no Alabama pode ser uma tarefa dantesca. Como formar pessoas de mente aberta, cidadãos do mundo, em uma terra onde impera uma mentalidade conservadora e pouco flexível? Afinal estamos falando do "Bible belt", um lugar onde o fanatismo religioso se mistura ao capitalismo e ao culto às armas de fogo.

Apesar das dificuldades isso foi acontecendo. Conhecer o mundo e outras culturas certamente ajudou. Descobrimos também que existem exceções à regra, que algumas pessoas pensam diferente e ousam fazer parte de uma minoria. Ter as suas próprias ideias nunca vai fazer de você a pessoa mais popular da escola ou da vizinhança, mas sem dúvida ajuda na formação do seu caráter e personalidade. E você pode usufruir do lado positivo. Pode sair às compras a qualquer hora da noite sem medo, respirar ar puro, ter um sistema de saúde e educação decentes.

Assim nos encontramos nessa espécie de limbo. Morando no sul sem sotaque ou mentalidade sulistas; nem completamente brasileiros ou americanos. Apesar dos prós e dos contras, está valendo a pena.

Por ZH

3 de abril de 2013

L'Amour




A primeira vez que eu pisei na Índia tinha 25 anos e voltaria para o Brasil depois de oito meses. Chegando, meu primeiro pensamento foi: “aonde eu vim me meter dessa vez”. Pânico, confusão, medo e muito, muito calor.

Para os que não sabem, sendo bem genérica e grosseira, a Índia é outro planeta no Planeta Terra, algo que defino como países impossíveis. Morei no sul daquele país, numa cidade longe de ser cosmopolita como Mumbai ou Nova Délhi.  Era realmente o fim do mundo.

Passados cinco anos desde essa aventura, passei a entender a célebre frase de Nietzsche, que diz que é preciso ter um caos dentro de si para dar à luz uma estrela brilhante. No meu caso, a estrela brilhante se chamava Amor. Eu encontrei o Amor em um lugar sem esperança e quando não estava procurando. Não tinha tempo de pensar nisso, estava muito ocupada sobrevivendo. E o Amor, como todas as coisas de Deus, não é óbvio.

Essa estrela brilhante transformou oito meses em cinco anos. Minha mala só com roupas de verão teve de ser rearranjada para enfrentar temperaturas europeias do mês de novembro. Não voltaria mais ao Brasil. Minha nova morada seria na Bélgica, país que até então só conhecia pelo seu tamanhinho e sua cerveja, mas que jamais poderia imaginar que lá moraria sem ao menos ter visitado. Pois bem, o Amor. Virei uma “Love refugee” como meus amigos gostavam de falar. Troquei um caminho certo por um desconhecido. Mas, de novo, eu gosto não só de países impossíveis, como coisas impossíveis. Hoje, do “alto” dos meus 31 anos, me pergunto de onde saiu tanta coragem. 

Aí, olho para as minhas costas e vejo uma cicatriz que diz “a sabedoria não está na razão, mas no Amor”. Foi do Amor que veio essa coragem.

Hoje, estou ansiosíssima, esperando que onze longos dias passem rápido. Porque, dessa vez, eu vou receber meu refugiado, que vem ficar ao meu lado, deste lado do mundo, lugar que eu chamo de minha casa. 


Por Letícia

20 de fevereiro de 2013

Português, Inglês, Italiano, Silêncio...

Sempre escutei falar que o inglês é a “língua universal”. 
“Sabendo inglês, você se vira em qualquer lugar!”
“Inglês é básico! Todo mundo tem que aprender!”
O problema, é que com tanto falatório, o mundo desaprendeu aquela que deveria ser “a língua universal”: o silêncio.
Li uma vez que o cinema precisou do som para descobri-lo, já eu precisei cruzar o oceano para aprendê-lo.
Il. era loira, tinha uma pele bronzeada, olhos azuis e impecáveis dentes brancos. Longe de aparentar seus 40 anos, cozinhar era seu dom, e a simpatia, uma de suas muitas qualidades.
Foram vários dias com Il. por perto.
Educada e muito bonita, ela me contou que era ucraniana, mas que morava em Praga. Que era casada, mas que morava com a sogra. Que tinha uma filha de 7 anos, que já havia viajado pela Itália, mas que gostaria de conhecer o Brasil.
Il. não falava português, nem espanhol, muito menos italiano. No inglês, arriscava uns “name”, “year”, “good!”. Já o Tcheco, sabia tudo! (Acredito eu!)
Comigo era apenas no português ou no italiano. Espanhol me deixava no zero a zero. Com o inglês enferrujado, não saia muito do “my name is”. E o Tcheco??? Nem no “name”.
A saída era o silêncio!
Agora eu te pergunto: Posso colocar no currículo?

Por Helena Salgado


23 de janeiro de 2013

Que descolorirá


http://www.flickr.com/photos/soniamadruga/5199210061/in/photostream/



Na história que meu pai nos contava quando éramos crianças, eu era a flor mais velha de pétalas coloridas que mudavam de cor toda vez que aprendia algo novo.

 Um dia desses, estava pensando sobre a experiência das mudanças e me dei conta que ser “forasteiro” nos tempos de adaptação é como voltar a ser criança. A cada passo uma nova descoberta, um novo desafio.
O aprendizado de uma forma geral, não é algo fácil.  Exige querer aprender, exige esforço, mas muda as cores do mundo ou, pelo menos, as cores do olhar que temos do mundo.

 Agora, tenho para mim, que mais desafiador que ser forasteiro, é encontrar a lição que o cotidiano, na sua simplicidade extrema e repetitiva, tem a nos oferecer.
Buscar o singelo contraste das cores de cada dia, aparentemente iguais, é o desafio que garante a vivacidade da aquarela que compomos com a nossa vida...

Por Mari


16 de janeiro de 2013

Nas Fronteiras do Humano

viagem pelo Rio Moa

Eu hoje moro no Acre, numa cidade que fica no extremo oeste do Brasil, fronteira com o Peru. Não sei ao certo o motivo pelo qual vim parar nessas fronteiras, talvez porque nunca fui de fazer grandes cálculos acerca dos caminhos que tomo.


À experiência no norte atribuo boa parte da minha compreensão de mundo; o choque com o diverso amplia horizontes. Talvez por essa razão seja sempre tão bem humorada quando questionada sobre a existência do Acre, tanto pelos que só querem uma razão para se aproximar quanto pelos que não compreendem a opção por um lugar tão longínquo. Não é possível escrever em poucas linhas o que significa morar no Acre. Lidar com um povo que ri quando tem vontade independente de onde estiver, que conversa honestamente não só por palavras, mas principalmente por gestos. Os gestos são realmente o que fascina. Eu não concebia pessoas cuja expressão corporal não estivesse limitada pelas regras do ‘bom convívio social’. Incomoda um pouco a lascividade evidente, embora meu olhar treinado a reconheça mesmo nos ambientes mais formais (com mil aspas: civilizados).  Mas o incômodo é o que tange as fronteiras do que se pensa ser o humano e pode alargá-las desde que o olhar esteja disposto. No entorno da cidade sobrevivem populações indígenas, espremidas entre os interesses latifundiários e o desprezo dos citadinos, que anseiam pelo dito progresso, para o qual os indígenas são barreiras constantes. Um mundo ininteligível, penso eu. Seu riso, seu gestual, suas crenças... penso entender, mas sei que minha mentalidade ocidental os inventa, assim como eles devem me inventar – e isso Roy Wagner me esclareceu. Sei que não são mendigos à procura da redenção pelo homem branco, nem coisinhas lindinhas saídas dos livros para me satisfazer e impressionar. Penso que muitas vezes vejo, mas não enxergo culturas tão diversas, mesmo porque elas nem sempre, ou não tão rapidamente, dão a conhecer de forma clara os seus sistemas de verdades, de convívio social e de relação com a terra. Eis que novas fronteiras se interpõem e segue a vida em terras acrianas. 

Blenda Cunha Moura