28 de agosto de 2013

Minha cunhada vai casar




Desde pequena, quando pensava no meu futuro, não pensava no meu dia, num escritório que me tornaria uma profissional bem sucedida: pensava em seis e meia da tarde.

Tô procurando a chave de casa e meia dúzia de cabecinhas me apressando. “Vai logo, mamãe, quero fazer xixi!” Abri a porta e duas bolinhas rosas entraram piruetando pela sala. Talvez toque pra elas dançarem depois da janta (aprendi piano pra tocar durante a gravidez). Entrou também uma que resolveu fazer ginástica olímpica só pra acabar com o meu coração de bailarina. Mais um moleque PRETO de tanto se jogar no chão no futebol (“direto pro chuveiro, sem encostar essa mão na parede, hein!”) e um no ombro do pai, mostrando o golpe que aprendeu no judô.
Criei uns braços a mais e fiz a janta e dei banho em metade. Hoje misturei beterraba no macarrão. “Mamãe, é da Barbie?!” “Eca, é de menina!” Como é difícil fazer essas crianças comerem! Sobremesa, todo mundo quer! E esse pai coruja ainda vive comprando sorvete... O cadeirão está vazio, a bonita não saiu do colo desde que chegou em casa (acho que estamos mimando demais essa menina).
“Anda logo, Lorenzo, só falta você! Você e os seus irmãos ainda têm que fazer o dever de casa!” Criança precisa de rotina. Depois da tarefa, historinha, santo anjo e CAMA!
Silêncio. Mas quem disse que pai e mãe se esquecem dos filhos alguma hora? Como estão lindos! Espertos, engraçadinhos, tão arteiros! Domingo a vovó não vai nem acreditar. Dente de um caindo, de outra, nascendo...

Nascendo também está uma família. Agora, em 2013. Minha cunhada vai casar. Não segurei o choro ao pensar nesse fruto tão bonito do matrimônio que é a vida, o amor. Disfarçado na rotina em forma de risadinhas.


B.M.

21 de agosto de 2013

No mar




Hoje de manhã quando eu estava no mar - diga-se de passagem: gelado, escuro, com ventos uivantes e uma garoa que caía na diagonal - comecei a refletir sobre a "unidade"... É engraçado, pois acredito que para cada pessoa ela se expresse intensamente de formas distintas. 

Todas as pessoas que eu conheço que "surfam" criam uma relação tão intensa com o oceano e com a prática que talvez só possa ser explicada pela "unidade". 

Estar no mar, depois do ponto onde as ondas quebram, sentado num lugar sagrado, onde nada nem ninguém vai te atingir (a não ser uma onda talvez rs), olhando para o aquela linha cinza entre o céu e o mar, esperando a série se formar, esperando a onda chegar... subitamente um peixe salta da água no horizonte e três pássaros passam ao teu lado num vôo rasante como se você não estivesse ali, como se - agora sim - você fizesse naturalmente parte da paisagem. 
É uma sensação espetacular... fazer parte de um todo, de uma unidade, e ser ao mesmo tempo tão insignificante e vulnerável. Mas se sentir imensamente grato por isso. 
...

Está frio. Você já não sente mais a ponta dos pés nem das orelhas. O mar nem está tão bom assim. O vento sul não perdoa. Mas lá ao longe você vê alguma coisa se formando... uma ondulação vindo na tua direção, para você, o universo está te dando um presente. Você começa a nadar, sente ela te puxando para trás. Você está mais alto e ela te desafia. É preciso levantar, agora. Toda a força do teu corpo te impulsiona para ficar em pé. Você sente um frio na barriga e desce, em pé, o presente que o oceano trouxe especialmente para você. Agora é só aproveitar, 5 segundos que parecem uma eternidade. Você olha para trás e teus amigos comemoram, felizes por você ter merecido aquele presente.   
...

Teus medos, ansiedades e angústias foram temporariamente lavados pelo mar. Você se sente mais completo, mais único, mais vivo. Nada te faria mais feliz naquele momento do que aquela onda.


Por Isabel Ziesemer Costa

8 de agosto de 2013

Inferno de gelo




Li uma vez a opinião de um autor que acreditava num inferno de gelo, apesar da maior parte das representações incluir o fogo.
Por diversas razões, meditava muito nisso esses dias.
E naquelas cenas cotidianas em que abrimos a geladeira para pensar, percebi que a minha estava começando a ficar com as paredes de gelo, o que indicava a hora de limpá-la.
Enquanto a limpava, refletia sobre os momentos que deixamos o nosso interior se cobrir de gelo.
Acredito que se o céu é para quem sabe ser feliz na terra, o inferno é para aquelas tristes figuras que se deixaram congelar por dentro.
A parte triste da história é que eu me sentia uma dessas tristes figuras.
E gostaria que fosse tão fácil como limpar a geladeira essa tarefa de descongelar pensamentos e sensações que nos prendem em remotas infelicidades.
Há quem diga que inferno e céu só existem na imaginação.
Eu diria que existem na consciência como uma tênue linha interior que distingue a felicidade da infelicidade.

Por Sofia