26 de março de 2014

Tão longe, tão perto




Quando eu deixei a minha cidade, a minha família, os meus amigos, a minha casa e os meus cachorros para cair nessa imensidão que é São Paulo e começar a faculdade dos meus sonhos, eu não fazia ideia do que realmente significava isso. 
Não imaginava que ia ser tão doce e tão amargo. Não imaginava que ia me sentir tão distante e tão próxima.
Estar longe dói com frequência. Não fazer parte do dia-a-dia de quem você ama é uma ferida constantemente aberta.
Mas ao mesmo tempo carrego todas elas, seus rostos, seus jeitos, seus cheiros, seus sorrisos, carrego-as no meu coração de um jeito que eu não fazia quando estava fisicamente perto. A distância muda o amor. Mas não na intensidade, somente na sua forma. Aprendi a amar de longe, e isso alargou meu coração. Alargou tanto que já começo a amar tudo isso que me é novo na vida. E multiplicam-se os rostos que eu carrego comigo. 
Me vejo alegre. Alegre porque fui capaz de escolher e minha escolha me transformou. Hoje vivo com mais peso. Com mais sentido, mais direção e mais magnitude (veja só, sou quase um vetor!). 
Mas a alegria maior está em saber que a mudança não termina. Viver é mudar, e crescer, e transformar, e aprender, e lutar. E em meio a tudo isso a gente ama. Ama os outros, ama as lutas, ama os dias. E o que era no início amargo se torna, gradualmente, cheio de doçura.


Adélia 

19 de março de 2014

Turquia




O dia em que decidi ir para a Turquia foi o dia em que já tinha me afogado em sofrimento. O meu namoro de quase seis anos havia se esvaído e aquele em que tanto confiava assumiu nunca ter verdadeiramente me amado. Eu tinha vivido seis anos pra ele. Seis anos em que não sabia quem eu era. E a minha viagem era a minha chance de tentar me descobrir. Cheguei num país diferente para encontrar uma amiga há tempos não vista na esperança de viver algo diferente. A Turquia se revelou pra mim uma cura. A convivência com pessoas que vivem com princípios de hospitalidade e respeito para com qualquer cliente, visitante ou passante me ensinou que devemos respeitar o outro. A cada chá oferecido gratuitamente para que eu me sentisse mais acolhida na loja, casa ou restaurante eu sabia que algo mudava em mim também. Em um momento, por exemplo, uma garota que sentou ao meu lado no ônibus de viagem e que sequer conseguia se comunicar comigo me comprou brownies. Simplesmente para que eu pudesse estar bem naquela viagem. Sem interesse algum. E essa foi apenas uma das histórias emocionantes.  Passei meu aniversário em Éfeso, na Turquia, entre ruínas de uma cidade que foi grega, romana e otomana. Longe de tudo e de todos, inclusive da minha amiga turca que ficou em Istambul. Estava em Éfeso e depois em Pamukkale e ainda na Capadócia. Sozinha. Mas em cada tour conheci gente do mundo todo. Fiz amigos, dei risadas e, embora sozinha em minhas descobertas, em nenhum momento me senti solitária. Pessoas diferentes me enriqueciam de mim mesma. Então voltei para Istambul para reencontrar minha amiga depois da viagem pelo interior da Turquia e pelo meu interior, e fui surpreendida por um bolo de aniversário, parabéns e presentes. Chorei de emoção vendo que existe amor sem precedentes no mundo. Existe amor sem limites. Um amor que transcende preconceitos, religião, costumes e crenças. E ele está dentro de mim. Precisei viajar para encontrar a mim mesma e ao meu amor. E foi na Turquia que me conheci. Um país que não é cheio de camelos, que não é radical com o islamismo e onde as mulheres têm voz e podem sim andar sozinhas sem medo. Fui extremamente bem tratada por todos que conheci. Aprendi a me sentir especial e hoje me respeito e me amo. Sozinha talvez, nunca solitária. Tenho dentro de mim as lembranças. Tenho dentro de mim tudo que não sabia que eu tinha. Tenho uma vida que vale a pena ser vivida. E que sempre valerá, não importa o que aconteça.

C. S.

12 de março de 2014

Amoramigo




Não é o dos poemas mais românticos, do jantar a luz de velas ou da ansiedade pelo primeiro encontro. Talvez, um dia (quem sabe?), até seja, mas o de hoje não é. O amor amigo é o do “porque não nascemos filhos/as da mesma mãe?” ou do “porque não nos conhecemos antes?”. É o clichê, desde “a família que nos permitiram escolher” até o “pede pra minha mãe pra eu dormir na sua casa?”. É o amor primeiro, é o que todos deveriam ter por direito e é o que nos ergue quando falta chão pra pisar. Esse amor é aquele que aparece quando você olha lá pra cima e pergunta se não tem mais nada de ruim pra acontecer com você, ou quando você está convicto de que já não existem meios de se ter “fé na vida, fé no homem, fé no que vier”.

Há um tempo (um ano, nem muito e nem pouco, mas o suficiente para que eu processasse todas as informações), resolvi embarcar, me enfiar de cabeça, mais especificamente falando, num sonho escondido: viajar para outro país, sozinha, e morar lá por um tempo. Eu tinha, como era de se esperar, todos os tipos de medo: de me perder, não entender a língua, ir mal nos estudos ou morrer de saudades da minha casa. Mas o medo maior, aquele que tirava o sono e molhava o travesseiro, era o de perder o lugar que eu tinha na vida das pessoas, na vida dos meus amigos. Querendo ou não, a gente sabe que família está ali, família é quase sempre fixa. Mas amigo... ah! Amigo a gente rega, aduba, assiste crescer todo dia.

Mas, e se eles se acostumarem com você longe? E se for verdade que “quem tanto se ausenta um dia deixa de fazer falta”? E se VOCÊ se acostumar sem eles? E se na hora de voltar já não existir seu espacinho na vida de cada um?


E aí vem a vida como um belo “há-há-há” bem no seu nariz. Afinal de contas, você mal sabe o que vem pela frente. Você não faz ideia de que todo o colorido da sua viagem virá deles, os amigos. E agora em dose dupla. Agora você vai conhecer quem estará contigo em uma das maiores e melhores experiências da sua vida, aprender a sentir saudade pra sempre e a confiar que amigo não tem regra, não expira. É engraçado como a gente passa a perceber e aceitar que na vida há quem apareça para ficar e há quem está só de passagem, e nenhum deles é mais ou menos importante. De algum jeito maluco e incompreensível, as pecinhas desse quebra cabeça vivo vão se encaixando. Quem tinha que ficar o fez, e você nunca vai saber como agradecer por isso. Quem precisou ir foi, e os motivos talvez não precisem ser entendidos. Quem quis aparecer? Esses vieram também, oras! Seus presentes de boas-vindas. E os que você precisou deixar, não porque quis, mas porque precisou... esses andam com você a cada sorriso que você dá e cada vez que seus olhos piscam, seu coração bate ou sua mente viaja. Eles hoje são parte de quem você é, de quem você se fez, de quem você aprendeu a ser.

Tha